A obesidade é uma doença crônica que pode trazer diversas consequências para a vida de uma pessoa e afeta uma enorme quantidade de indivíduos. De acordo com dados apresentados no Congresso Internacional sobre Obesidade (ICO) do ano passado, quase metade dos brasileiros adultos (48%) sofrem com essa condição e mais 27% terão sobrepeso até 2044.
Esse número é muito importante, já que a obesidade pode trazer problemas como diabetes ou doenças cardiovasculares. Assim, não é à toa que essa condição é cada vez mais estudada. E, com isso, surgem mudanças em como ela é vista no mundo da medicina.
Obesidade = IMC?
Basicamente, a obesidade é, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), caracterizada pelo excesso de gordura corporal em níveis que podem comprometer a saúde. E atualmente isso é analisado a partir do IMC (Índice de Massa Corporal), que é calculado fazendo a divisão do peso de uma pessoa (em quilos) por sua altura (em metros ao quadrado).
Se esse índice estiver igual ou acima de 40, a pessoa está dentro da obesidade. Contudo, recentemente, o jornal científico The Lancet Diabetes & Endocrinology divulgou um estudo que propõe a redefinição dos critérios para o diagnóstico da obesidade. Segundo os autores, para definir a doença é preciso analisar outros aspectos além do IMC (Índice de Massa Corporal).
Esses aspectos incluem a distribuição de gordura, medição da cintura, relação cintura e quadril, relação da altura com circunferência da cintura e problemas de saúde relacionados ao peso. Para Alessandra Rascovski, endocrinologista e diretora clínica da Atma Soma, o questionamento trazido pelo estudo sobre a dependência do IMC para constatar um quadro de obesidade é pertinente.
“Essa nova abordagem enfatiza o cuidado mais personalizado, focado na saúde como um todo e não apenas no número que a balança mostra. Isso é sim uma grande evolução na forma de avaliar, visto que sabemos que há mais de 200 condições relacionadas à obesidade”, explica.
Obesidade clínica e obesidade pré-clínica
O estudo ainda propões uma distinção clara entre o que é obesidade clínica e obesidade pré-clínica. Ele reforça que são condições diferentes em termos de gravidade e necessidade de intervenção.
A obesidade clínica é uma doença crônica que resulta em disfunção de órgãos e representa uma ameaça mais séria à vida. Ela exige um tratamento mais intervencionista, que pode incluir medicamentos, cirurgia ou outras terapias intensivas. Já a obesidade pré-clínica tem maior gordura corporal ou peso elevado, mas com baixa tendência a afetar os órgãos de forma significativa.
“Nesse caso, ela é uma pré-doença, e não a doença em si”, comenta a especialista.
Outro ponto que Alessandra enfatiza é sobre a relevância do entendimento de onde está ocorrendo o acúmulo de gordura no corpo e se o ganho de peso está surtindo efeitos na saúde. “Uma pessoa que tem o pescoço curto, não é gorda, mas ganha cinco quilos e começa a ter apneia do sono. E outra, com obesidade, com IMC 40, não tem nenhum sintoma de doenças clínicas decorrentes da condição. São situações muito particulares que demandam um olhar mais amplo”, diz.
O estudo elencou 18 indicativos que sinalizam quando a obesidade se torna uma doença em adultos. São algumas delas: perda de visão, doenças de cabeça, apnéia do sono, falta de ar, insuficiência cardíaca, fadiga, inchaço nas pernas e ritmo cardíaco irregular.
Preocupações com o estudo
Apesar de apoiar a ideia de a obesidade não ser resumida ao IMC, a médica endocrinologista ressalta preocupações sobre a sugestão de que a obesidade não precise ser rigorosamente tratada em estágios pré-clínicos, quando ainda não há doenças associadas, como o diabetes tipo 2.
Ela destaca que a adiposopatia (doença da gordura) é um fator causal relevante para o desenvolvimento de condições crônicas. Tratar a obesidade precocemente pode ter um caráter preventivo.
“Além disso, a nova classificação, que propõe 18 critérios para o diagnóstico, pode ter certas limitações ao não considerar aspectos como a história pregressa de peso do paciente e sua percepção sobre o impacto do peso no bem-estar”, aponta.