Muito do que você aprendeu sobre a escravidão – seja no dia a dia ou até na própria escola – pode não ser tão verdade assim. Portanto, selecionamos cinco tópicos controversos que detalham os interesses por trás de equívocos disseminados até os dias de hoje. Confira!
Foto: Wikimedia Commons
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Feijoada foi uma criação dos cativos nas senzalas?
Quando se trata de recordar a herança cultural africana no Brasil, a feijoada sempre aparece como iguaria de ligação direta com o período colonial. Contudo, a ideia de que os escravos aproveitavam as sobras de comida (especificamente, pés, orelhas e rabo de porco) para criar o famoso prato não é a versão mais aceita pelos historiadores. Na verdade, acredita-se que a feijoada surgiu como forma adaptada dos pratos comuns na Europa – o cassoulet seria o “primo” mais famoso da versão brasileira. Então, o que os servos comiam se a feijoada não era o improviso que criaram para se alimentar? Com a escassez de alimentos, já que os produtos de Portugal eram muito caros e como o cultivo no Brasil também não era desenvolvido, a farinha de mandioca, além do feijão, do milho e das frutas, compunha a dieta dos cativos.
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A capoeira foi trazida da África?
Já em solo brasileiro, a luta nasceu como uma criação dos escravos africanos da etnia banto, no século 17. Assim como o samba e as religiões de matriz afro, a capoeira era proibida até o final da década de 1930. Porém, nunca deixou de ser praticada e ganhou mestres de peso no decorrer dos anos, como os consagrados mestre Bimba e mestre Pastinha. Hoje, são mais de oito milhões de praticantes no mundo, sendo que, compreensivelmente, mais de seis milhões são do Brasil.
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Zumbi dos Palmares também tinha escravos?
A pergunta costuma vir à tona sempre que o papel de resistência de Zumbi é questionado. O herói tinha, sim, escravos e colaborava para a manutenção do sistema no Quilombo dos Palmares, localizado na antiga capitania de Pernambuco (hoje Alagoas). Entretanto, é consenso entre os especialistas que, à época, seria muito improvável que Zumbi, um rei, tivesse ideais iluministas e abolicionistas em seu tempo. Portanto, sua luta era baseada mais na crença de que seu próprio grupo fosse liberto – o que não invalida seu histórico de resistência.
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Manga com leite faz mal?
A resposta é não. E o que esse mito tem a ver com a história da escravidão? A questão é que a lenda foi criada justamente para impedir o consumo do alimento, uma vez que o leite era um dos itens mais caros adquiridos na colônia. Nenhum senhor “correria o risco” de ter a bebida consumida por um escravo e, paralelamente, como as mangueiras e seus frutos eram fartos, os cativos comiam muito a fruta que estava ali, à disposição. Surgira assim, a invenção da mistura venenosa. Afinal, se a história contada envolvesse apenas o suposto veneno do leite, logo cairia por terra na primeira vez que um feitor fosse flagrado bebendo a “preciosidade”. Ainda hoje, muitos acreditam que o leite com manga traz prejuízos ao organismo, o que é refutado com veemência por médicos e nutricionistas.
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Os negros da África praticavam a escravidão?
Embora os números indiquem que até 10 milhões de negros da África cruzaram as águas rumo ao “novo mundo”, transformando-se em mão de obra escravizada, a prática escravista também existia no continente africano. Isso porque a prática é herança dos povos da antiguidade, com ocorrências na Grécia Antiga, bem como em Roma e na região da Mesopotâmia. Considerando a extensão territorial do continente africano, é absolutamente aceito que diferentes povos conviviam na mesma área, e a relação no século 16 era de disputas de poder e submissão. Desta maneira, os perdedores acabavam capturados e eram obrigados a trabalhar de maneira compulsória. Além disso, muitas sociedades estabeleceram que a escravidão seria a punição para diversos crimes, incluindo roubo e adultério.
Texto: Bruno Ribeiro e Tatiana Santos