Desde o surgimento do Snapchat, em 2011, usuários, em especial adolescentes, passaram a usar e abusar dos filtros que prometem efeitos “embelezadores” como afinar o nariz e engrossar os lábios. No entanto, na prática, o uso indiscriminado dos filtros resultou no aumento da procura por procedimentos estéticos a fim de aproximar a imagem real àquela gerada pelos efeitos presentes nos aplicativos digitais.
Assim, em 2018, especialistas e estudiosos criaram o termo Dismorfia do Snapchat, em referência à rede que foi pioneira na criação de filtros para incrementar as selfies. Tal problema se enquadra dentro do chamado Transtorno Dismórfico Corporal, em que a pessoa passa a enxergar defeitos no próprio corpo; mas, no caso da Dismorfia do Snapchat, os pacientes buscam ficar semelhantes aos filtros, hoje presentes em todas as redes sociais, especialmente no Instagram.
Uma pesquisa da Academia Americana de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva Facial mostrou que 72% dos cirurgiões sentiram o aumento da procura por cirurgias estéticas em 2019, 15% a mais que em 2018. No entanto, o problema se agravou durante a pandemia, visto que o tempo de acesso às redes sociais aumentou com o isolamento.
Apesar de ainda não existirem dados específicos sobre a relação entre pandemia e cirurgias plásticas no Brasil, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica aponta que, nos últimos dez anos, houve, sim, um aumento de 141% no número de procedimentos entre jovens de 13 a 18 anos, e um dos motivos seria a alta exposição nas redes sociais.
O cirurgião plástico Ronaldo Soares, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, afirma que são muitos os casos de pessoas que vão aos consultórios em busca de ideais de beleza artificiais e fora da realidade. “Vemos pessoas que desenvolvem uma obsessão em cima de imagens irreais, que a medicina nem é capaz de proporcionar”, alerta.
De acordo com Soares, a média de idade dos pacientes com a Dismorfia do Snapchat que buscam cirurgias é entre 15 e 30 anos, sendo mais frequente entre os usuários mais jovens. “Devemos fazer o diagnóstico de Transtorno Dismórfico Corporal e encaminhar o paciente para tratamento com psicólogo ou psiquiatra, pois nestes casos não é recomendado fazer a cirurgia plástica, visto que a probabilidade do paciente se frustrar e piorar seu quadro mental é muito elevada”, explica.
O médico esclarece que a autoimagem do paciente precisa ser tratada adequadamente, de forma que danos não sejam causados às pessoas que buscam intervenções cirúrgicas. Logo, quando falamos de adolescentes, a situação é ainda mais grave. Assim, Soares é enfático em relação à idade: ele não opera pessoas com menos de 18 anos, exceto casos em que haja justificativa, como as chamadas orelhas de abano, deformidades físicas e outros quadros que, de fato, tenham relevância na vida do paciente.
Portanto, com exceção desses casos acima, a recomendação do médico é primeiro buscar terapia e somente após as consultas avaliar se realmente há a necessidade de realizar uma cirurgia plástica.
Fonte: Ronaldo Almeida Soares, médico formado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com especialização em cirurgia geral e plástica pelo Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.