Se descobrir uma mentira depois de algum tempo é ruim, saber a verdade enquanto a pessoa ainda mente para você consegue ser pior. Mas não havendo provas ou fatos, como podemos provar que aquele discurso se trata mesmo de uma fala mentirosa?
"A mentira está presente em nosso cotidiano e identificar um mentiroso exige treino para perceber as mínimas inconsistências no discurso e, principalmente, para saber o que fazer uma vez que as identificou", destaca o advogado e entrevistador forense André Costa, que lida diariamente com essas investigações em seu trabalho.
Segundo o profissional, embora seja difícil, alguns pontos podem, sim, entregar tanto uma mentira, quanto seu autor. Dessa forma, prestar atenção no comportamento e, sobretudo, nas falas, pode ser a direção certa para identificar a falácia.
A memória curta do mentiroso
Como os fatos não aconteceram de verdade, tudo é inventado e isso dificulta que uma linha do tempo seja mantida. Assim, cada vez que a mentira for contada terá detalhes alterados. Nesse sentido, André explica que sem um detalhamento do acontecido na memória, fica difícil sustentar as versões e diversas lacunas vão surgindo na história.
Exagero emocional
"Mentira e exagero emocional caminham lado a lado. A pessoa confessa o que fez em tom de brincadeira na tentativa de afastar a chance de ser perguntado algo sobre aquilo e adota postura defensiva quando questionada", exemplifica o advogado.
Seguindo essa linha emotiva, o indivíduo pode demonstrar sensibilidade e estresse exagerados durante um único diálogo, principalmente quando abordado em relação a algo que não quer contar. Portanto, mudanças bruscas de humor e temperamento podem ser um indicativo.
Comportamento
Certos sinais corporais podem entregar a pessoa sem perceber, como desviar o olhar, reduzir o tom de voz, responder de forma vaga ou fornecer detalhes desnecessários e desconectados do tema central — ações muito frequentes em depoimentos e investigações.
Além disso, em um diálogo verdadeiro, a pessoa tem por hábito se inserir nos relatos, diferente do mentiroso. Seu discurso é evasivo e recorre a termos amplos, como "fiquei sabendo" ou "me disseram", de modo a evitar qualquer comprometimento.
Outro ponto sobre as falas é que a postura e a linguagem adotadas podem mudar drástica e rapidamente. André relembra casos em que o entrevistado se referia a alguém com proximidade e, logo depois, quando se tratava do crime, mencionava essa mesma pessoa de maneira formal.
A negação
A omissão é frequente nos discursos mentirosos, pois o mentiroso deixa em aberto a possibilidade de o evento ter ocorrido de forma diferente daquela, apresentando, novamente, uma fala evasiva.
"Investigando um caso de assédio, ouvi de um gestor que ele nunca teve envolvimento com uma subordinada, mas na sequência, disse que ‘nunca tinha se envolvido com nenhuma menina da sua área dentro da empresa’. Sua declaração fez muito sentido, pois os casos de envolvimento sempre ocorriam em eventos fora do seu local de trabalho", conta o especialista.
Fonte: André Costa, advogado, entrevistador forense e especialista em detecção de comportamentos com certificações da Polícia Federal, Academia Israelense de Investigação e da Associação de Entrevistadores Forenses dos Estado Unidos.